Mapeando os Centros do Saber

  Assumindo a Caraíba, o Normélio promoveu, em poucos meses, uma revolução naquela empresa, alcançando resultados espetaculares. Um ano depois, assisti uma palestra dele sobre os primeiros resultados que colhera na nova função, e o convidamos para reproduzi-la num dos nossos Seminários Trimestrais no PGQP. Vou extrair apenas dois episódios desta palestra, por serem marcantes e estarem relacionados com o tema que estamos abordando neste livro.


  Para o evento do PGQP convidamos, além do Normélio, o Pery Falcon, na época presidente do Sindicato dos Metalúrgicos na Bahia e ativo membro da cúpula do PT. Assim, no mesmo evento, falaram o representante do acionista, abordando uma gestão forte, de mudanças, alcançando brilhantes resultados. Logo depois, o mesmo espaço foi ocupado por um líder dos trabalhadores, reconhecido no meio que representava. Assisti a ambas às palestras ao lado do Jorge Gerdau, empresário símbolo do liberalismo em nosso país. Já pelo final da palestra do Pery Falcon, o dr. Jorge se virou para mim e comentou não concordar com uma afirmativa do palestrante.

– “Dr. Jorge” – observei – o homem está falando há mais de 30 minutos, e só agora o senhor discordou de uma posição que ele apresenta. É fantástico!”

Na realidade, Normélio e Falcon, executivo e sindicalista, chefe e empregado, eram ambos fanáticos pelo TQC – e cada qual o usava como ferramenta para conseguir os resultados que almejava para os respectivos representados. E ambos apresentavam, com igual entusiasmo, a mesma abordagem, sobre o mesmo tema. A palestra do Normélio incluía com afirmativas do tipo
  • “quando me disseram que a Caraíba tinha muitos problemas, respondi, aos que me convidaram a assumir a presidência, que isto facilitaria o trabalho: bastaria resolver os problemas. Pior seria se ele estivesse mal, e os problemas não fossem conhecidos…”
  • “Tínhamos que recuperar 254 U$/t de cobre vendido, para voltarmos a ser lucrativos. Foi bem simples: chamei todos os diretores e gerentes, montamos uma espinha-de-peixe, e cada um pegou um pedaço…
Semanas depois, um visitante, que recém saíra da fábrica, me telefonou, assombrado:

– “quando eu estava na portaria, meu colega precisou voltar, porque esquecera algo no escritório. Fiquei no carro, esperando, e o vigilante veio me perguntar se eu me importava que ele apagasse a luz do prédio. É que estava no Grupo que tinha como meta colaborar com 1$/tonelada de economia em economias tipo conta de luz…”

No final da intervenção do Pery Falcon, uma frase me impressionou demais:

“Senhores empresários: basta vocês nos darem metas claras e assegurarem uma aposentadoria digna, e sair da frente. Podem deixar o resto conosco”


  No início de sua gestão o Normélio tomou duas providências de impacto, que são uma eloqüente demonstração do que pretendemos ressaltar, sobre gestão do conhecimento como solução:

1. Chamou todos os fornecedores dos seus principais equipamentos, para que fizessem um diagnóstico completo sobre a forma com era feita sua manutenção, como estavam sendo operados e informar que progressos haviam surgido na tecnologia, nos cerca de 20 anos decorridos desde sua instalação;

2. Buscou identificar onde, no mundo, estavam os Centros do Saber da metalurgia do cobre, e despachou seus técnicos para uma rápida reciclagem. Feita de forma extremamente pragmática, a parte mais importante desta reciclagem fora concluída em poucos meses; o nível de conhecimento tecnológico e de comprometimento haviam crescido de forma impressionante.


 

Em qualquer negócio, pensando estrategicamente, é preciso mapear as Fontes do Conhecimento, a nível mundial.

  É preciso ter noção de onde estão, preocupar-se em ter acesso a elas. Depois, fazer com que o que delas é solução para um problema real de operação, chegue o mais rápido possível para o operador. O crítico é dosar o investimento, de modo que haja retorno financeiro nos gastos e na sustentação das equipes que se dedicam ao tema.
  Mapear Fontes é diferente de sair à busca de uma solução para um problema. No primeiro, o crítico é saber manter o foco; no segundo, obter resultados. Seguindo o caminho da solução de problemas, cujo custo-benefício é fácil de controlar, normalmente ampliamos o nosso mapa, o que nos permitirá resolver problemas futuros. É um princípio de pragmatismo, semelhante ao que muitas empresas fazem, para dosar seus investimentos em marketing, outra área em que as decisões dificilmente são óbvias: dimensiona o recurso pela geração de demanda, e faz o institucional de arrasto….
  Participamos de muitos casos, tanto de busca mais ampla, de Fontes do Conhecimento, como para resolver problemas do aqui-e-agora. Nas próximas páginas nos dedicaremos a eles, com bastante detalhe. Como mapeamento, de forma ampla, talvez os principais instrumentos fossem nossa participação em Feiras e Congressos.
  Nós mapeávamos as grandes Feiras e Congressos Internacionais, e organizávamos as delegações que as visitavam. Tínhamos algumas técnicas que contribuíam para nossa produtividade:
  • cobrar relatório específico de cada participante, cuja primeira página deveria, obrigatoriamente, mencionar o que ele iria realizar como conseqüência da oportunidade que tivera. Mais do que pagamento da passagem, era condição necessária mas não suficiente para participar da próxima…;
  • cada um de nós tinha alguns objetivos específicos, para problemas reais;
  • no primeiro dia, fazíamos uma varrida rápida na feira, para identificar oportunidades. De noite, organizávamos o roteiro do dia seguinte;
  • todas as noites, nós nos reuníamos para trocar experiências e orientar colegas para reforçar pontos de interesse;
  • nós já tínhamos pré-agendado uma semana de visitas após a feira; com isto, a terceira semana era dedicada a visitas agendadas durante o evento. O que era necessário, porque a maioria dos expositores tinha pouca disponibilidade na semana seguinte: ou descansava, ou recuperava o dia-a-dia prejudicado pelo seu esforço concentrado;
  • procurávamos, sistematicamente, reforçar relações pessoais e buscar oportunidades de visitas de benchmarking. O espírito de feira abre a cabeça das pessoas, dos dois lados do balcão…

  Nossa participação em Congressos seguia ritual semelhante. Dividíamos as áreas de interesse que cada um abordaria, e nos separávamos para assistir aos cursos e palestras simultâneas. Sempre que havia material distribuído antecipadamente, nós líamos o que era possível na primeira noite (e nas seguintes), que nos poupava da perda de tempo em palestras frias. Numa certa época fomos proibidos de apresentar trabalhos em eventos nacionais, porque estaríamos ensinando mais do que aprendendo de nossos concorrentes. Foi uma época desagradável, éramos conhecidos como chupins de Congresso, íamos ver e não mostrávamos nada.
  • Felizmente, não durou muito. Como conseqüência do Programa de Qualidade, conseguimos quebrar este tabu, inclusive abrindo nossas empresas para visitas de colegas. Não tenho dúvidas de que acelerou muito o nosso desenvolvimento tecnológico.

  O ponto alto destas visitas de aquisição de conhecimento foi, durante quase uma década, a organização das missões ao Japão. Muitas foram organizadas sob o guarda-chuva do aprendizado do TQC, mas nossa ênfase em busca de aquisição de conhecimento em tecnologia sempre foi, no mínimo, equivalente. Nas missões organizadas pela Fundação Cristiano Otoni o rendimento da transmissão de conhecimento era muito baixo. Grupos muito grandes, explicadores não acostumados a lidar com esta circunstância, apresentadores não habituados a falar com tradução, tradutores nem sempre adequados… enfim, era muito estressante, mas, ante as alternativas que tínhamos, maravilhoso! Com o tempo, a situação foi mudando. Primeiro, havia o show da Florida Power & Light, em dia fixo por mês, perto do aeroporto de Miami. O TQC começou a repercutir na ASQ – em inglês, com bons vendedores, tudo fica mais fácil. Eu cheguei a organizar duas destas missões. A terceira, eu propus fazê-la de outra forma: o pessoal se encontraria em Congonhas, mas, em vez de entrar num avião, entraria num ônibus. E visitaria empresas (inclusive japonesas) no Brasil, com apresentações em português, no mesmo fuso horário, com taxa de aprendizado 5 vezes maior. O custo era tão mais baixo que, de quebra, daria para comprar umas garrafas de whisky e uma filmadora, para cada um, mesmo sem usar as benesses do duty-free… Finalmente, o PGQP, no Rio Grande do Sul, disseminou de tal forma as práticas da Qualidade, que assistir aos seus seminários e visitar as empresas premiadas se tornou ainda mais barato, conveniente e produtivo. Ninguém mais foi ao Japão para ver qualidade. Todo o ciclo não durou dez anos.
  Mas o maior impacto de missões japonesas foi o contrato de assistência tecnológica que mantivemos com a Nippon Steel, coordenado pelo Paulo Santos. Participei pouco deste processo, e o que escrevesse sobre ele seria muito pequeno, em face ao enorme progresso que o este contato sistematizado com os japoneses nos trouxe. Vou ficar no aguardo do livro do Paulo.   banner_instrutor3]]>

Compartilhar:

Share on facebook
Share on twitter
Share on linkedin
Share on whatsapp

Mais posts

RECEBA NOSSA NEWSLETTER

Estamos no WhatsApp

Ao clicar em "aceitar cookies" você aceita que a Qualitin colete algumas informações do seu dispositivo e navegador, que permitem-nos personalizar o conteúdo que é exibido e controlar o desempenho do site. Para mais informações consulte nossa Politica de Privacidade.